quinta-feira, 18 de janeiro de 2018


Já se viu que o Pe. Manuel Álvares reedificou a Capela de São Bartolomeu. Ignora-se a data do seu nascimento, mas sabe-se que em 13 de Julho de 1614, quando foi recebido como irmão da Santa Casa da Misericórdia, morava na Rua de São Bartolomeu.
O Pe. Manuel Álvares faleceu em 1652, de “morte apressada”, sem ter ocasião para fazer testamento. Há a tradição de que a sua morte terá resultado duma queda talvez do cimo do tecto da capela.
Este sacerdote está sepultado do lado sul da Igreja da Lapa. No seu assento de óbito escreveu-se:

Nos oito dias do mês de Agosto de mil seiscentos e cinquenta e dois anos faleceu o Pe. Manuel Álvares com o sacramento de Santa Unção somente por falecer de morte apressada e estar incapaz dos mais sacramentos. Diz o encomendado Agostinho Fernandes não fez testamento.

Veja-se o mesmo assento na grafia original:

“Em os oito dias do mes de Aguosto de mil seis centos e sinquoenta e dous annos faleceo o p.e Manoel Alz com o sacramento de Santa Ounçam som.te por falecer de morte apressada e estar incapax dos mais sacramentos dis o encomendado Agus.tho fes. não fes testamento”.

Na margem esquerda ainda se lê:

“Fes hum off.o de clériguos e hum de des e dous de nove.
O P.e M.el Alz”.

Curioso que o autor desta nota lateral tenha o nome do falecido.
Em 1721, o prior vila-condense escreveu que em São Bartolomeu estava sepultado “um sacerdote de boa opinião, chamado Manuel Álvares”. Esta observação é bastante mais importante do que parece uma vez que viveram na Vila muitos sacerdotes concubinários e que por isso não mereceram boa opinião.

O Sumário das Indulgências

Na sacristia da Igreja da Lapa, conserva-se uma pauta de indulgências concedida pelo papa Urbano VIII: deve vir do séc. XVII e as indulgências foram obtidas em tempo do Pe. Manuel Álvares e com certeza por seu empenho[1]. É um documento que demonstra grande zelo da parte de quem actuou para que fosse concedido.
O Sumário das Indulgências concedidas aos confrades da “Confraria do Glorioso Apóstolo São Bartolomeu” é um generoso documento dum tempo em que as pessoas apostavam muito no sufrágio dos mortos; ora estas indulgências dispensavam-no ao menos em parte. Há-de ter tido um efeito muito marcante no aumento do número dos irmãos e nas visitas à capela.
Embora dê relevo à Confraria de São Bartolomeu, já fala em Nossa Senhora, São Lourenço e São Matias.
Deve tratar-se mesmo dum sumário, da versão resumida dum documento maior vindo com certeza em latim.

Sumário das Indulgências concedidas aos confrades da Confraria do Glorioso Apóstolo São Bartolomeu desta Vila do Conde por autoridade do nosso mui Santo Padre Urbano VIII, nosso senhor, ora na Igreja de Deus Presidente.
Primeiramente, todo o fiel cristão, homem ou mulher, que entrar nesta Confraria do Glorioso Apóstolo São Bartolomeu, no primeiro dia da sua entrada, se verdadeiramente arrependidos de seus pecados, confessados e comungados, alcançam indulgência plenária e remissão de todos os seus pecados.
Concede Sua Santidade aos confrades da dita confraria, assim aos que são como aos que adiante forem, que no artigo da morte, se verdadeiramente confessados e comungados e arrependidos de seus pecados, ou se o não puderem fazer, ao menos, contritos, invocarem o Santíssimo Nome de Jesus com a boca ou com o coração, lhes concede Sua Santidade indulgência plenária de seus pecados.
Sua Santidade concede a todos os confrades e consorores que são ou forem, que, verdadeiramente confessados e comungados, visitarem a Igreja do Glorioso Apóstolo São Bartolomeu[2], das primeiras vésperas até ao sol-posto do mesmo dia, em todos os anos, e aí rogarem a Deus pela concórdia dos príncipes cristãos e pelas extirpações das heresias e pela exaltação da Santa Madre Igreja, e semelhantemente indulgência plenária e remissão de todos seus pecados.
Outrossim concede Sua Santidade aos confrades que verdadeiramente confessados e comungados visitarem a mesma Igreja do Glorioso Apóstolo nos dias da festa da Assunção e Anunciação de Nossa Senhora e do Glorioso Mártir São Lourenço e do Apóstolo São Matias, des(de) as primeiras vésperas até ao sol-posto dos mesmos dias, indulgência plenária e remissão de todos seus pecados.
Todas as vezes que estiverem às missas ou outros ofícios divinos que se celebrarem, ou em público ou em particular, por (palavra ilegível) via feitos ou derem pousada aos pobres ou compuserem pazes entre os inimigos ou também aqueles que acompanharem os corpos dos defuntos às sepulturas ou quaisquer procissões que se fazem de licença do ordinário e acompanharem ao Santíssimo Sacramento, assim nas procissões como quando o levam aos feridos que estando impedidos, dado o sinal para isso da campana, disserem uma vez o Pai-Nosso e Ave-Maria ou também rezarem um Pai-Nosso e Ave-Maria pelas almas do Purgatório e dos confrades defuntos ou encaminharem alguém que vá desencaminhado ao caminho da salvação e ensinarem os preceitos de Deus aos ignorantes ou excitarem (exercitarem) outra qualquer outra obra pia e todas as vezes por qualquer das ditas obras lhes relaxa Sua Santidade sessenta dias de perdão e penitência a ele (palavra ilegível) impostas ou por outro qualquer modo devidas na forma costumada da Igreja.
Estas indulgências quer Sua Santidade que valham para sempre.


Assento de óbito do Pe. Manuel Álvares.


Campa do Pe. Manuel Álvares junto à parede sul da Igreja de Nossa Senhora da Lapa.


Retrato do Papa Urbano VIII. Urbano VIII foi papa entre desde 1623 a 1644, em tempo por isso do Pe. Manuel Álvares.

  
Este Sumário de Indulgências e a tábua da Lenda da Berengária, em Santa Clara, foram com certeza escritos pelo mesmo artista no século XVII.




[1] O artista que escreveu na madeira este documento foi com certeza o mesmo que escreveu a “tábua” da Lenda da Abadessa Berengária que se conserva no Mosteiro de Santa Clara.
[2] Não era propriamente igreja, mas uma pequena capela.

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